terça-feira, 7 de setembro de 2010

Fim da impugnação ao cumprimento de sentença e o princípio do ônus do tempo do processo no novo CPC

O projeto de lei nº166/2010, entitulado "Novo CPC", alterou o regramento da defesa do executado na fase de execução no procedimento sincrético. É porque na sistemática atual do CPC de 1973, com as alterações que lhe foram promovidas pelas leis federais 11.232/05 e 11.382/06, a execução das sentenças condenatórias proferidas pela via cognitiva (processo de conhecimento) operam-se por simples petição denominada de "cumprimento de sentença". Nessa fase, a resistência do devedor dá-se mediante apresentação de defesa entitulada de "impugnação". Para melhor clarear a cadeia argumentativa, veja-se como é a sistemática da atual fase de cumprimento de sentença.

Da sentença proferida no processo de conhecimento, caso não seja impugnada por apelação, conta-se um prazo de 15 (quinze) dias para que o réu efetue espontaneamente o pagamento do crédito. Com o decurso do prazo sem o pagamento voluntário, incide-se automaticamente multa punitiva de 10% (dez por cento) sobre o crédito exequendo (art.475-J). A partir de então, a requerimento do credor (cumprimento de sentença) segue-se com a expedição de mandado de penhora e avaliação des bens, e deste ato intimando o devedor, para que, em querendo, apresente impugnação (o devedor não age, reage) no prazo de 15 dias, contados da intimação da penhora e avaliação dos bens.

No atual regime de defesa do executado, a impugnação ao cumprimento de sentença tem natureza nítida de incidente processual (resistência do devedor), de forma que o devedor poderá se defender nos próprios autos do procedimento executivo. Em verdade, trata-se de defesa limitadíssima, com previsão de matérias arguiveis contidas no artigo 475-L do CPC, tais como: "Nulidade ou ausência da citação, ilegitimidade do título executivo e quaisquer matérias impeditivas, modificativas ou extintivas do direito do credor, desde que superveniente a sentença".

Não obstante o rol limitado das matérias arguiveis pelo executado na impugnação, é possível obstar a agressividade dos atos expropriatórios da execução, mediante a atribuição de efeito suspensivo, diante de sólida linha argumentativa do devedor, que deverá demonstrar que o prosseguimento da execução poderá lhe causar grave dano de difícil e incerta reparação. E aqui cabe tecer algumas considerações sobre o princípio do ônus do tempo do processo.

O ônus do tempo do processo é princípio estruturante da sistemática executiva, que impõe ao devedor a responsabilidade de demonstrar em sua defesa (impugnação ou embargos à execução) que a continuidade dos atos expropriatórios poderá lhe causar dano de difícil ou incerta reparação. Isso porque o credor possui título executivo judicial (decisão judicial) ao seu favor, oriundo de processo de conhecimento que tramitou durante anos até a prolação da decisão. Na fase executiva, o credor viabiliza, por meio da técnica executiva, a tutela do direito material pleiteado iniciamente com a propositura da demanda. Por isso, é mais do que justo restringir ao máximo a possibilidade de agregar efeito suspensivo à impugnação ou aos embargos à execução, por ser portador o credor de título executivo judicial ou extrajudicial, respectivamente.

O credor, portador de decisão judicial fruto da participação em processo de conhecimento que tramitou durante anos até a prolação de decisão final, não pode aguardar a satisfação da tutela do direito material pleiteado na fase executiva. De maneira que a técnica executiva e o desenrolar dos atos expropriatórios deve ser obstado apenas mediante argumentação robusta do devedor, e que explicite que a continuidade dos atos executivos poderá lhe causar danos teratológicos. Nesse caso, o ônus do tempo do processo corre contra o devedor.

Pensando justamente na satisfação do credor após a prolação da sentença (técnica processual), a comissão de juristas que elaborou as linhas iniciais do novo CPC extinguiu a figura da impugnação da sistemática executiva do novo código.

Em verdade, a comissão confeccionou nova figura defensiva no regramento da execução de sentenças condenatórias (cumprimento de sentença) do novo CPC. Trata-se da figura das "Alegações do devedor", contida no artigo 496, §1º. Certo é que o novo regramento é mais célere (aplicação do ônus do tempo do processo) e eficaz do que a atual impugnação. Vejamos como funcionarão as "Alegações do devedor" do novo CPC.

Proferida sentença condenatória, o réu ainda dispõe do prazo de 15 (quinze) dias para efetuar o pagamento voluntário do crédito. Nesse momento, o devedor poderá lançar mão de defesa, por meio de simples petição (igual à impugnação), denominadas "Alegações do devedor". Veja-se que no atual regime, existem dois prazos. O primeiro de 15 (quinze) dias para pagamento voluntário do crédito. O segundo, igualmente de 15 (quinze) dias, contados da intimação do devedor da penhora e avaliação dos bens, para apresentação de defesa (impugnação).

No novo CPC o devedor somente poderá apresentar defesa "Alegações do devedor", no prazo que dispõe para efetuar o pagamento do débito, ou seja, 15 (quinze) dias, que se iniciam com a data de publicação da sentença. Curiosamente, o rol das matérias arguiveis nessa defesa são idênticas àquelas contidas no atual 475-L do CPC, referente à impugnação. Caso sejam apresentadas as alegações do devedor, a multa punitiva de 10% do atual 475-J não deverá ser aplicada. Contudo, rejeitadas as alegações do devedor, incidem-se multa de 10% punitiva semelhante ao atual 475-J mais ampliação de honorários advocatícios, até 20%. Por fim, uma das novidades mais atraentes das "Alegações do devedor" são que elas não possuem efeito suspensivo e nem lhe pode ser atribuído tal efeito, por ausência de previsão legal. Cumpre ao devedor, por meio de simples petição, requerer a adequação da penhora, caso esta incida sobre bem personalíssimo, cuja futura expropriação poderá lhe causar danos teratológicos.

As mudanças são sutis, mas são benéficas ao regramento executivo e a satisfação da tutela do direito material do autor. À uma, houve significativa alteração de prazos, que na atual sistemática contam com 30 (trinta) dias e no novo CPC restão apenas 15 (quinze) dias. À duas, porque não há possibilidade (ao menos legalmente) de se atribuir efeito suspensivo à defesa do executado na fase de cumprimento de sentença.

O texto segue melhor aperfeiçoado diante das implementações que lhe trouxeram as leis federais 11.232/05 e 11.382/06.