quinta-feira, 16 de julho de 2009

285-a, contraditório e algumas situações interessantes

O artigo 285-a do Código de Processo Civil brasileiro, acrescido pela Lei Federal 11.277/06, trouxe algumas situações interessantes (conflituosas) à sistemática processual civil. O referido dispositivo permite que o juiz de primeiro grau reproduza sentença proferida anteriormente em processo idêntico ao caso sob análise, desde que a matéria controvertida seja exclusivamente de direito e a sentença tenha sido de total improcedência. Nesse caso, a citação do réu poderá ser dispensanda.

Vejamos algumas situações interessantes criadas pela introdução do novo dispositivo. Proferida sentença nos moldes do artigo 285-a, poderá o autor interpor apelação. Nesse caso, o § 1º do aludido artigo permite ao juiz proferir juízo de retratação, ou seja, não manter a sentença e ordenar o prosseguimento da ação, citando-se o réu para apresentar defesa. Caso contrário, deverá citar o réu para responder ao recurso (contra-razões de apelação). Daí surgem as interrogações.

1º fato interessante: Ao proferir sentença nos moldes do artigo 285-a, o juiz julga de plano (decisão de surpresa) e não possibilita ao autor dialogar através de um espaço argumentativo-discurssivo, intimando-o para se manifestar sobre a decisão a ser prolatada. O juiz apenas argumenta no sentido de que o caso concreto é idêntico a processo antecedente, com matéria exclusivamente de direito e resolve o mérito. Essa decisão fere o contraditório constitucional (em sentido forte), que fica postergado para a fase recursal.

2º fato interessante: Interposto recurso de apelação, o relator do tribunal deverá lhe negar seguimento, caso seja manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do supremo tribunal federal ou de tribunal superior. Veja-se que mesmo da interposição de recurso da decisão que aplica o 285-a do CPC, o autor pode ser surpreendido pela utilização do 557 do CPC. Nesse caso, o contraditório não é apenas mitigado, mas obliterado. Perceba que fica cada vez mais dificil para o recorrente dialogar sobre a decisão de improcedência da ação, mesmo valendo-se de inúmeros recursos.

3º fato interessante: Antes mesmo dos autos irem ao tribunal, o juiz de primeiro grau não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do STJ ou do STF, parágrafo primeiro do artigo 518 do CPC. Mais uma vez, o recorrente é barrado por dispositivo semelhante ao 557 do CPC. Novamente, o autor deverá se utilizar de recurso (agravo de instrumento, 522 CPC). Perceba que a decisão que não recebe o recurso de apelação é decisão de surpresa, pois não permite ao recorrente a oportunidade de argumentar e questionar a aplicabilidade da súmula impeditiva de recursos.

O que se percebe em todos os casos citados, é a utilização desenfreada de recursos para combater as decisões proferidas e o deperdício de tempo precioso (que poderia ser sanado com a simples concessão de vista ao autor para manifestar-se sobre a decisão a ser exarada pelo órgão monocrático).

Em todos os casos, o contraditório é mitigado e tranplantado para a fase recursal, quando não é completamente obliterado.


quarta-feira, 1 de julho de 2009

Dica de leitura para o mês


A obra foi escrita pelo professor Doutor Dierle Nunes, em tese de Doutoramento cuja orientação seguiu-se pelos professores doutores Nicola Picardi e Marcelo Cattoni.

O trabalho do autor é singular, evidenciado por sua técnica e profundamento no assunto. É como informa a sinopse do livro: A presente obra [...] combina de forma cientificamente rigorosa, numa linguagem clara e precisa, história do direito processual civil e direito processual civil comparado, teoria do direito, teoria democrática, sociologia jurídica e dogmática processual civil, de tal modo a desenvolver, por um lado, uma genealogia das reformas processuais, suas influências e origens, e, por outro, uma crítica vigorosa aos seus descaminhos. Mas ela não pára por aqui; com certeza, não se está diante de uma tese negativa. A maior contribuição científica que esta obra apresenta, para além de um estudo inédito no Brasil acerca da história das reformas processuais e da crítica aos seus resultados, é a sua perspectiva teórico-discursiva de reconstrução democrática do processo civil, que implica reconhecer o caráter comparticipativo, policêntrico, do processo civil que passa a ter o contraditório – a participação em simétrica paridade na preparação das decisões - como princípio constitutivo e estruturante, assim como a exigência de revisão dos fundamentos de legitimidade da autoridade jurisdicional, no marco do paradigma procedimentalista do Estado Democrático de Direito.

Eis a dica.